
imagina que te escrevo em voz baixa. falamos sempre baixo quando queremos que acreditem nas nossas palavras, e tudo o que aqui te escrevo é verdade. escrevemos porque ninguém ouve. escrevo-te porque estás longe, numa cidade onde o nevoeiro roubou o ar ao sol e as pessoas pensam mais do que sentem. se estivesses agora aqui ao meu lado, sorririas (como irás sorrir mais tarde) ao ler a minha descrição sobre esse teu insípido local onde vives. se ao menos estivesses aqui comigo, eu abraçava-te e falava-te das minhas manhãs. de como o meu avô ainda me vem chamar à cama às 6h50 e eu afasto logo os lençóis da cama só porque não quero que ele diga mais alguma coisa (sabes como eu odeio que me falem quando estou a acordar). dizia-te como desço as escadas e como o pequeno-almoço, já preparado quando chego, de olhos fechados. se aqui estivesses, eu podia contar-te que demoro mais de meia-hora a arranjar-me porque fico metade desse tempo sentada a pensar, a pensar muito nas minhas coisas. a seguir descreveria-te a minha saída de casa e o frio que sinto sempre nas mãos porque eu sou muito do calor e sabes como odeio luvas ou qualquer outro meio de aquecimento. queixaria-me a ti da minha espera de quase dez minutos cada manhã, no ar gélido, da minha boleia para ir para a escola. por fim, falaria-te de mim, para que me pudesses conhecer novamente (porque eu mudei em algumas coisas) e diria-te do fundo do coração ou do fundo do que quer que seja quando queremos dizer que estamos a falar muito a sério: tenho saudades tuas.