ouvi a voz dela e comecei a chorar. nestes dias tenho-o feito muito. chorar, digo, porque ouvi-la já não é frequente. sabem quando temos tantas saudades e um aperto tal que não conseguimos falar? é isso. mas falei, e disse-lhe que me faz falta. não consigo fazer agora nada para me aproximar porque eu própria estou um caos mas espero secretamente que ela tenha paciência. no entanto, não perdi a minha sinceridade (nem a minha fragilidade, infelizmente). ouvi a voz dela e comecei a chorar apenas porque lhe sinto a falta.
a sabedoria popular tem a utilidade de um programa da manhã numa televisão perto de si. sempre que os conselhos se precipitam de dedo em riste, têm a força da razão da maioria. acontece que a razão não é democrática. e as maiorias tendem a transformar a experiência em meras receitas. há quem vá morrendo por dentro de tão bem aconselhado. por isso, quando o conselho for seguir em frente, interessará perceber se em frente é o caminho por ser certo, ou por ser mais fácil, apenas porque regressar é percorrer o mesmo caminho duas vezes. o que se conhece é sempre mais acidentado do que aquilo que apenas se supõe.
eu não quero que essa rotina que todos nós conhecemos nos aperte. que cheguemos a um ponto tal, que só de ouvir a tua voz fico exasperada. não há nada mais deprimente do que a decadência de uma relação, seja ela de que teor for. querido, eu tenho medo só de pensar nisso! imaginar um futuro assim, em que a irrevogável coisa que teria seria o meu espaço e que o ponto mais alto do meu dia seria escrever sobre o nosso romance falhado e, no fim, sentir-me péssima por isso.
sou mimada, pois sou. e não descanso enquanto não consigo atingir a meta da maneira que eu quero. uma miúda mimada adormece cansada da noite de festa, e acorda muito feliz porque sonhou com o rapaz por quem se apaixonou. dávamos as mãos e éramos felizes - contou à sua melhor amiga.
durante a minha vida, só tive três regras, simples: nunca me apaixonar realmente; nunca me prender por ninguém; nunca chorar por um rapaz. quebrei-as a todas (já alguém dizia que as regras eram para serem quebradas) e chego a um ponto que não sei se me desiludo a mim mesma por ter ido contra todos os princípios e ideias que tenho. voltei aos piores dias, porque tudo o que era mau estava à beira de sair (está sempre), mas eu tinha um apoio, uma barreira contra isso. voltei aos piores dias e voltei a conseguir saber o que sempre fiz melhor: ficar imóvel durante horas. não falar, não comer, não olhar directamente para nada, não pensar e principalmente, não sentir. apenas ficar numa posição durante o máximo de tempo possível. alivia, sempre me ajudou, mas não é uma cura. contra tudo o que era possível, eu voltei a estar vazia. mas este é um sentimento diferente, mais profundo. é vazia de alma, não se sente já nada porque não há nada para sentir. ela volta, claro, tudo o que digo aos outros em momentos maus da sua vida eu acredito plenamente nisso, e eu sei.. ela voltará.
sinto-me miserável neste momento e mais miserável ainda por pôr aqueles que me rodeiam repletos de medo e incertezas. eu só quero encontrar o dia em que acordo de manhã, sabendo que nada na minha vida precisa de ser alterado.
foi ao supermercado e não reclamou na fila que não diminuia, apenas suspirou. atravessou a rua a saltitar, como quando tinha 10 anos. chegou à porta de casa cansada das 3 subidas que subiu carregada de sacos. olhou para a sala e sorriu para a avó que se entediava numa sopa de letras difícil de completar. apeteceu-lhe ir dormir e não foi, porque estava feliz demais.
tudo fazia muito mais sentido antigamente. eu era ingénua, não sabia o que queria da vida (apesar de agora nada disso ser muito diferente), contava os dias para a chegada do verão e dizia, a quem me perguntava, que um dia seria escritora. tudo era bonito nesse tempo, pelo menos o sentimento o era. não passou muito tempo desde aí mas e agora? estou cansada e não sei o que fazer. apenas tenho esta vontade enorme de desaparecer por uns tempos. fazer as malas e viajar para um sítio bem longe daqui. talvez tóquio. ia passar todos os dias a ouvir boa música, a dormir pelo menos nove horas por dia, a escrever todos os dias - hábito esse que perdi -, a comer pasta ao almoço e sushi ao jantar e habituar-me-ia àquele nevoeiro matinal mágico. tudo, se continuasses ao meu lado ainda.