não estás cá como estarias há um ano atrás e eu sinto-me bem com isso. tenho pena do que nos tornámos. tu não?
a minha casa não cheirou a canela este ano. não passou o natal por minha casa apenas porque não cheirava a canela e porque não estava frio para podermos estar à lareira. sinto-me triste porque eu gostava do natal, antes de toda esta era consumista, sabes. eu gostava do natal porque na minha família era diferente, e tu lembras-te, tu lembras-te porque eu te contava sempre como era.
cheguei ao fim da trilogia do livro que marcou a minha vida. sinto-me estranha por dentro, triste por ter dito adeus a esta parte de mim, por fechar um capítulo que tão boas recordações me traz. sinto-me triste por dizer adeus à sara, à hanna, à camilla, e a tudo o que de bom me ensinaram. tenho agora chico buarque a cantar melancolicamente no quarto para acompanhar a tristeza e já ninguém o faz tão bem como ele.
respirei fundo e decidi que aquela não era vida para mim. endireitei-me, saí de casa, desliguei-me de toda a gente e fui para onde mais gosto de estar. passei dias com amigas, fiquei até às quatro da manhã sentada em cama alheia a falar de tudo e de nada, acordei no dia seguinte cedo e passeei com as pessoas que mais gosto. respirei fundo, recuperei forças e tracei outros objectivos de vida. o ano está quase a acabar e não sei precisar se foi um bom se foi um mau mas para o ano não quero que seja igual certamente.
fazíamos hoje um ano. passou tudo sem eu dar por isso e não consigo parar de me perguntar como é que é possível. como é que tudo isto foi possível. como os dias se sucederam tão rapidamente se nem dei por eles passarem por mim, como me tornei na primeira metade do nosso ano tão centrada em ti, tão apaixonada, tão sem noção, tão sem vida própria e na outra metade uma pessoa tão horrível, como te consegui amar tanto se nunca acreditei em amor, como apesar de tudo não me consigo arrepender nem de um segundo que tenha passado contigo. 
hoje conto apenas pelos dedos de uma mão as pessoas que dizem conseguir ter orgulho em mim e mesmo assim não chego às cinco. é normal, eu não tenho nem sei como elas conseguem. é por isto que agradeço por não estares na minha vida hoje sabes.. para não teres de conhecer quem sou agora. 
fazíamos hoje um ano m. foste a pessoa que mais me marcou e alterou o meu percurso de vida. o teu lugar é insubstituível sem sequer ser possível duvidar. 
fazíamos hoje um ano.. não fazemos.
1 ano. há um ano atrás dei o primeiro passo para o que me fez tornar tão diferente. o tempo passou depressa, muito depressa na verdade. 
fiquei paralisada, o pensamento quebrou-se, os músculos não se mexeram mais. não me lembrava da existência daquele caderno e quando o encontrei foi como se tudo o que se passou naquela fase voltasse só de reler todas as páginas e páginas que tinha escrito a tentar tirar a tristeza instalada já nos ossos. não tinha ideia na altura do que estava a fazer, do erro que cometia. 
basta uma vez. pode ser superficial, mas basta uma vez. ficamos atraídos pelo sangue e pensamos que podemos ficar reduzidos a apenas uma pequena área do corpo, pequenos cortes superficiais que rapidamente saram e desaparecem. rapidamente se descobre que não é assim. a minha pele está a arder, tenho as mãos a tremer e a cabeça pesa. a minha visão está a ficar turva enquanto tento afastar do pensamento, evitar entregar-me. não consigo, não consigo. no entanto, sei que consegui. já se passaram anos e sei que hoje penso no quão incorrecto foi. haverão sempre ideias erradas sobre este assunto porque nunca ninguém o põe em cima da mesa. a verdade é que isto não é coisa de filmes, não somos influenciados por seitas americanas, não o fazemos por sermos crianças. fazemos porque queremos sentir alguma coisa para além do que já sentimos. não é uma questão de ser fraco, é uma questão de ainda não ter aprendido a lidar com os problemas. lembro-me perfeitamente o dia em que deixei de o fazer. estava lentamente a tornar-se um hábito e nem me apercebi. só continuamos porque não sabemos onde nos estamos a meter. basta uma vez. mesmo que superficial, o sangue que sai atrai mais do que afasta. basta uma vez e toda a nossa vida muda. 
as pessoas nunca deviam sair das nossas vidas quando já nos habituámos à sua presença. acontece sempre assim. entram de repente, ficam por um tempo, e logo quando pensamos que as teremos para sempre ou pelo menos durante muito tempo, desaparecem. acontece sempre assim e eu cansei-me disso.
disse-te que tinha saudades tuas, fizeste então uma piada habitual e oh, eu soube logo a razão de gostar tanto da nossa amizade.
a vida passou por mim e disse-me adeus. e eu continuei sentada sem mexer um músculo. podia ser que voltasse e se deixasse de brincadeiras. não voltou e eu estou exausta.
há dias maus, muito maus. e é estranho isso acontecer quando ainda no dia anterior fora um dia bom, muito bom. o meu calendário está trocado, os horários cruzam-se e o que me parecia aceitável já não parece. dói-me a cabeça, uma dor que não passa, e tenho o olho direito a tremer muito desde ontem. sinto-me cansada e as conversas de hoje desanimaram-me. hoje foi um dia mau. muito mau.
perdi a paciência para jogos de sedução. quero alguém que venha para ficar. sem meios-termos ou vontades secretas. já não tenho paciência para olhares que não dizem nada, ou para palavras que não possuem significado algum. sem discussões ou cenas absurdas. perdi a paciência para gente infantil e inconstante. quero alguém que me provoque mil sensações de uma vez só. sem desconfianças ou saídas repentinas. perdi a paciência que tinha, e agora só quero o suficiente para acordar todos os dias com vontade de o fazer.
dormi 16h seguidas e ainda não me sinto descansada. tenho a mente a todo o vapor, o pânico a subir outra vez garganta acima como tinha sempre que falava contigo durante umas horas. o ar começa a faltar, começas a virar a cabeça para todos os lados à procura de uma saída, deixas de ouvir o que te dizem porque na cabeça só há uma voz a gritar, a procurar uma forma de escapares. sabes que queres sair dali, que não queres mais ouvir, que precisas de respirar mas tudo vai sendo controlado. às vezes escapa-se de forma leve, outras é preciso um grito mais elucidativo. mas no final, de ambas as formas, foi um peso que se tirou. o meu não quer sair, e eu vou acumulando tentando não gritar.
deixei de acreditar no amor. desisti de príncipes, desisti de jogos, desisti de querer receber grandes mensagens cheias de coisas como se fossem ditas ao ouvido e tantas outras deixadas por dizer, desisti de encontros, de olhares que não passam despercebidos. desisti de abraços, de beijinhos, de mãos dadas e grandes passeios. desisti de querer contar o meu dia a alguém. desisti de felizes para sempre, porque não há era uma vez. todos os meus era uma vez tornaram-se em daquela vez e normalmente continuaria dizendo o erro que teria cometido. deixei de acreditar no amor e fui mais prática, mais segura, com menos floreados. no fundo, ainda havia uma esperança de me aperceber o quanto estava a fazer errado, mas não. não caí no chão porque já tinha todas as seguranças a postos previamente.. do mal o menos. mas eu chamei-te amor, e.. amor, eu deixei de acreditar em ti. e que triste que isso me parece, não achas?
sê dura com os outros na justa medida em que eles são duros contigo. aprende a ficar quieta quando o mundo te pede que te movas. aprende a calar se queres que se calem. aprende a ouvir nos gestos quem te quer bem quando te abraça e quem te quer mal quando te beija. não te esqueças de arrumar as gavetas das tuas memórias antes de deixar entrar alguém na tua vida. fala pouco, devagar, para teres a certeza de que serás ouvida. fala de tudo e de nada, não te cales se fores interrompida. fala do mundo e do tempo, pouco dos outros e nada de ti. elogia quem te faz bem, afasta do teu caminho quem te quis fazer mal. lembra-te que o orgulho tem mais força que as lágrimas, guarda as dores dentro do peito ou transforma-as em risos. sai antes do tempo, para que nunca se cansem de ti. volta quando não te esperam, fica apenas quando te pedem. ri-te das piadas dos outros, mesmo que não tenham graça. trata bem quem não conheces, desconfia de quem te quer bem de repente.
agitada e noites sem descanso. é assim que me encontro. todas as madrugadas se inserem novos sonhos, cada vez mais estranhos, cada vez mais assustadores, cada vez mais envolventes, na minha mente já exausta. hoje foi mais um, que me envolveu até aos ossos e me fez temer ter perdido a parte mais integra que ainda mantenho. foi negro, e ao mesmo tempo branco, muito branco, com aquelas paredes de hospício, com aquelas escadas intermináveis que conhecia como a palma da minha mão, com aquele corpo, com aquelas pessoas mortas por dentro. e eu que me sentia em casa ali, com as paredes de hospício, com as escadas sem fim, com aquele corpo e com aquelas pessoas desprovidas de interior. tive medo e não consigo fazer com que ele passe.